quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Despedida.

Amado Costelinha, Escrevo essa carta com você ainda em meus braços. Mesmo ciente de que são seus últimos momentos aqui nesse plano, esse estágio final que antecede sua partida parece irreal, como um sonho. Seus suspirinhos são frágeis e sonoros já que exerce certa força para fazê-los e inúmeras dúvidas me atordoam... se você tem sede, se algo dói, se devo deitar-lhe na cama... essa última dúvida logo sai de meu pensamento pois quero tê-lo em meus braços o máximo que puder. Aqueles filmes todos com cachorro que a gente assiste e chora, onde um cão modifica a família toda positivamente e que rendem risadas e choros... poderia ser nossa história, né? Afinal, você modificou minha vida de uma forma tão maravilhosa, tão linda, tão pura, que me faz crer que cães são anjos que Deus coloca em nossas vidas. Lembro-me do dia que nos vimos pela primeira vez. Quatro anos atrás, naquele 23 de novembro e seus mais de trinta graus de tempo seco: você extremamente peludo e com manchas de sangue seco numa das patas no começo da avenida. Do ônibus, meu coração lamentou tanto seu sofrimento, mas tanto, mas tanto, que me doeu fisicamente e sua imagem não saiu da minha cabeça. Ao contrário de outros animais que vejo nas ruas e fico triste por eles, você permaneceu em minha mente o dia inteiro e, mais de seis horas depois, quando eu voltava do trabalho, você continuava naquela avenida. Havia andado tanto que já estava na outra ponta. Meu ônibus parou e pude vê-lo perdido, entre os carros, um quase lhe pegou e dessa vez não pude me conter: chorei muito! Imediatamente, envie mensagem pra sua mãe Jaque dizendo que nós tínhamos que fazer alguma coisa por você! Nós precisávamos! Cheguei em casa ainda chorando, liguei para seu tio Maurício e juntos fomos ao seu encontro. Nunca esqueço a sensação que enchia meu coração porque NUNCA antes em minha vida havia sentido algo tão intenso assim, era um chamado de socorro, me dava desespero imaginar o tamanho de sua sede porque estava muito calor, você tinha andado muito, estava sem tosa, sem rumo... e você correu! De novo, entre os carros! Só conseguimos te pegar quando você entrou numa rua sem saída. As pessoas daquela rua saíram assustadas, mas depois entenderam que nós estávamos te salvando. Lembro que eu não senti medo algum de você e lembro também (nossa, como eu lembro!) do seu olharzinho pra mim, levantando sua cabecinha e tentando me ver através da sua ‘’franja’’ rs. Molhei meus dedos com a água que levei numa garrafa e coloquei em sua boca, sem medo que me mordesse, fato esse aliás que você nunca cometeu. Você entendeu e, bebendo aquela água, matava a sede que te matava e assim, me aliviava a alma. Naquela noite, eu, seus tios Mau e Gio e sua segunda mãe (Jaque) descobrimos que você estava com um buraco na barriga. Uma costela quebrada “ou por atropelamento ou por espancamento’’ disse o veterinário. Como por muitos meses você tremeu e demonstrou medo toda vez que qualquer homem se aproximava de você, acreditamos na segunda hipótese. Não sou capaz de imaginar a dor que você estava sentindo. Um buraco na barriga feito pela própria costela fraturada, não havia garantia de que, lhe operando, você iria se salvar. Mas você se salvou! Se recuperou. Costelinha virou seu nome (por razões óbvias!) e fomos muito felizes juntos. Muito mesmo. E eu sempre dizia: ‘’Algum motivo Deus teve de colocar esse cãozinho no meu caminho, não sei qual é, mas Ele sabe’’. Hoje, eu sei. Você veio pra trazer felicidade a essa casa. Veio pra me ensinar a ter paciência e ser mais agradecida ao que tenho. A dar mais valor as pessoas que convivem comigo. A amar gratuitamente. São tantos momentos que me passam agora que só escrevendo um livro pra contar o quão transformadora foi a experiência de ter o presente de conviver com você por esses quatro anos. Mesmo com todo sofrimento (e olha que não foi pouco, arrisco dizer que foram os piores, mais tristes e difíceis momentos de toda minha vida) que envolveu sua doença até o seu atual estado terminal, eu te resgataria mil vezes mais. Lembro-me de dizer a alguns amigos a seguinte frase: “Não foi eu que o salvei e sim ele que nos salvou.’’ E é isso filhinho. Você me salvou. Me tornou menos egoísta e mais paciente. Me fez ter um pouquinho do gosto de ser mãe, de ter um serzinho totalmente indefeso e totalmente dependente de mim. Eu te amo e vou sempre te amar. Esse amor que você plantou em mim e que eu nem sabia que era capaz de ter ou existir, é motivo de gratidão absoluta. Eternamente... meu pudinho amado. Te amo. Mamãe. São Paulo, 19:27, 15/10/16. Edit: Ontem, após cinco dias de um jejum decidido por ele mesmo (parou de engolir qualquer alimentação, mesmo que líquida, que estávamos dando há meses através de seringa) meu Costelinha descansou. Descansou do corpinho mais magro e fraco que já pude observar. Descansou das agonias e dores que eu nunca vou saber se ele tinha ou não já que, pela graça de Deus não demonstrava, tamanha fraquezinha. Me conforta saber que você foi em paz, num cantinho seu, num lar cheio de amor, do nosso amor. Um amor TÃO forte que eu nunca achei ser capaz de sentir. Só consigo pensar o quanto Deus foi maravilhoso de permitir tudo isso, tudo que passamos juntos, do seu encontro até o seu último suspirinho, e ser feliz por que você teve uma velhice digna, foi amparado, foi socorrido e descansou porque foi como Deus quis e determinou. Vamos te amar pra sempre.

Não Li & Nenlerey

Sabe aqueles textões do FaceBook que nem seus amigos mais chegados se animam pra ler? Então, eu sei. Aí fiz esse blog pra POSTAR TEXTÃO AVONTS! Oie!